É público e notório que há clubes do Popular de Barcelos mergulhados em sombrias crises directivas. Fomos ao encontro de um clube “histórico” do Popular, onde este mal é um facto constatado. Falamos com Mário Costa, o Presidente da Assembleia Geral do anterior mandato dos Órgãos Sociais do GDRCampo e que terminaram funções em 31 de Dezembro de 2019. Mantem-se ao leme da embarcação, juntamente com mais cinco elementos: António Moreira, Pedro Mota, Rui Barbosa Pinheiro, Rui Filipe Pinheiro e Alexandre Marques e para que ela não afunde e consiga aportar em segurança. Estão à espera que apareça alguém, para assumir a passagem dos comandos. Não está fácil.
Domingo às dez: Ponto de situação actual do GDRCampo? Há por aí umas “bocas” que o clube vai fechar?
Mário Costa: O Grupo Desportivo e Recreativo de Campo é como o seu nome indica, para além de Desportivo é também Recreativo, além disso, tem a vertente cultural. Pensar que o GDRC se restringe só à prática do futebol é redutor. O GDRC tem implementado e conduzido outras actividades, não têm é a projecção e notoriedade do futebol. O que está neutralizado neste momento é a equipa de futebol do escalão de Seniores. O mesmo acontecendo com os escalões de Formação. O Clube não fecha, poderá é alterar o seu foco de actuação. O Clube é dos Sócios e são eles que escolhem a música que o Clube terá que dançar.
DD : Qual a razão para a referida neutralização do futebol?
MC: A neutralização das camadas de Formação, prende-se com o facto de não haver miúdos para formar as equipas dos diversos escalões. A baixa natalidade é um facto a nível nacional, fecharam escolas por falta de miúdos e Campo neste particular é como os outros, não foi exepção. Para além disso, os clubes vizinhos que melhoraram as condições de treino, relvando os seus campos, acabaram por se tornarem mais apelativos e concentrarem os poucos jovens praticantes que havia em cada uma das freguesias circunvizinhas. Não critico isso. Eu também preferia que o meu neto praticasse o futebol onde lhe dão as melhores condições de treino e de jogo. É normal querermos sempre o melhor. Esses clubes é que estão bem, estão na onda do progresso evolutivo e os seus Órgãos Sociais, só têm que ser felicitados por isso.
A neutralização da equipa de futebol sénior, tem a ver com a falta de recursos humanos para trabalhar. Não há vontade. A falta de uma lista candidata ao último acto eleitoral, conduziu-nos ao actual momento. Está o GDRC a ser gerido por uma Comissão Administrativa, somos seis elementos, o que é manifestamente insuficiente para manter o futebol em actividade. Daí a nossa decisão, aliás, fizemos o que está previsto no Regulamento Interno, para estas situações.
DD: Só isso? Não haverá outras razões?
MC: No nosso caso, foi só isso. Mas, o facto de não se candidatar nenhuma lista ao acto eleitoral, terá na minha opinião, outras razões…
DD: Quer especificar?
MC: Durante o nosso mandato, foram feitas diversas actividades recreativas e culturais; uma caminhada, algumas aulas de Zumba, paint ball, duas exposições, um Torneio de Malha, um Torneio de Sueca e sabe qual foi o grau de adesão dos sócios? Nula, quase zero…isto dá vontade e é motivador para se continuar a trabalhar? Não! O ridículo da questão e só para fundamentar melhor a minha opinião, no caso das aulas de Zumba. Numa iniciativa similar numa freguesia aqui vizinha, a maioria das “alunas” são de Campo. Repare bem, anulamos as aulas de Zumba porque não era sustentável ter duas ou três alunas, nem dava para pagar à instrutora credenciada e aqui ao lado a mesma iniciativa conta com a maioria das alunas de Campo. Isto só tem um nome: forças de bloqueio ou de boicote.
Depois o pagamento das quotas. É obrigação dos Sócios pagarem as quotas, segundo o RI. Estivemos quatro domingos no Salão Paroquial, para as receber. O facto foi divulgado no Boletim Paroquial. Sabe quantas quotas cobradas? Quatro, contando com as do Pároco que também é sócio. Tivemos que andar de porta em porta para conseguir alguns pagamentos. Ninguém nos negou o devido pagamento é um facto, mas é desgastante e confrangedor andar a “pedir pelas portas” para uma coisa que não é minha, não é do Manel nem é do Tone, é de todos os sócios. Perdem-se duas ou três manhãs a dar a cara, andar a esmolar por uns irrisórios 10 euros anuais…que, não chegam para manter uma equipa a disputar o Campeonato. O apoio das empresas locais também diminuiu bastante. Repare bem, são precisos no mínimo, em números redondos 1000 euros mensais para manter a equipa no Popular de Barcelos. Repare, não pagamos a atletas! Estou a contabilizar somente: água, luz, gasóleo, material desportivo, tratamentos médicos e farmacêuticos, lavagem de equipamentos e instalações e a marcação e manutenção do campo de jogos. Para os atletas, dois jantares convívio: o de Natal e o encerramento da época desportiva. As quotas e apoios não chegam, de maneira que há sempre um deficit mensal que vai sendo acumulado ao longo da época desportiva. Quem paga? Os elementos dos Órgãos Sociais do seu próprio bolso, ou então organizam eventos onde ninguém comparece. Está alguém disposto a isto? Não! Ao constatar tudo isto ninguém se candidata, ninguém é sádico a esse ponto. A não ser que lhe sobre dinheiro. Para não falar das críticas tóxicas e destrutivas, mas, essas poderíamos nós muito bem com elas, porque não dão prejuízo…só desgastem psicologicamente e não a todos. Há alguns que estão imunes a isso.
DD: Então o GDRC caiu no vazio directivo, certo?
MC: Nada disso, o GDRC está a ser gerido conforme preconiza o Regulamento Interno para estas situações. Existe como disse uma Comissão Administrativa. Não há vazio directivo.
DD: Mas é como se o GDRC não existisse, certo?
MC: Nada disso, permita-me discordar. Já com a CA em vigência, preparou-se a celebração do 43º Aniversário em Julho com o programa possível, que a crise pandémica sobejamente conhecida permitiu. Tínhamos agendada uma Semana Cultural com teatro pelo TPC de Carapeços e uma actuação do Coral Magistroi, que foram cancelados, por razões que têm a ver com a pandemia. Além disso, foi neste mandato que se preparou o lançamento de um livro sobre a história do GDRC e que está à espera de apoios para ser publicado. Foi neste mandato que se recuperaram alguns dos instrumentos musicais, da Banda Popular de Campo, que estavam mais ou menos “emprestados” e ninguém sabia deles, extraviados há 14 anos. Ainda falta o trompete, mas virá, sou um homem de fé e acredito na palavra das pessoas.
DD: Presume então que o balanço do vosso mandato é positivo
MC: Não queria falar disso, porque sou uma pessoa discreta e os meus companheiros de Direcção também o são, mas, fizemos algo de concreto, embora ninguém bem advogue em causa própria. Não somos é adeptos do “show off”. E quando o Campeonato foi neutralizado, a equipa do GDRC estava em posição de subida de Divisão, o que também poderá ser considerado uma facto positivo.
DD: Quer falar-me do livro que está preparado? Parece-me uma coisa interessante.
MC: Não queria levantar o muito o véu, para não afastar o efeito surpresa, mas posso adiantar, que é um livro que fala da história do futebol em Campo, desde os anos 50 do século passado, do primeiro clube de futebol, o Sporting Clube de Futebol de Campo, que em 1977 daria origem ao actual GDRC. É um livro com cerca de 200 páginas e cerca de 80 fotografias, muitas delas antigas e desconhecidas da maioria das pessoas de Campo. Está à espera de apoios. Foi pedido um apoio à CM de Barcelos. Foi analisada a obra por aquela entidade e depois de ser considerada de interesse relevante para Campo e para o Desporto no Concelho de Barcelos, foram-nos prometidos 1.500 euros, aliás, isto é público, vem nos boletins informativos camarários, não estou para aqui a inventar nada. Mas são precisos 5.000 euros, de modo que está parado à “espera que chovam” os tais 5.000 “euritos”…
DD: Mas a quantia nem se quer é elevada, não há apoios?
MC: Não! Os que existem são insuficientes. O assunto já foi levado à Assembleia de Freguesia e também nos foi prometido algum apoio, mas como não é ano de eleições…entende, não entende? Para além disso, seria uma obra para o futuro, para que daqui a 60 ou 70 anos, quando a maioria de nós estiver já na transformação química, haja um documento, que conte aos que cá estão, das dificuldades que passaram os fundadores de clubes como o GDRC. Não foi fácil nem nada caiu do céu…. Gasta-se muito mais em foguetes durante o ano, que tem uma duração muito efémera e com efeito no mínimo duvidoso e é uma quantia que considero irrisória, tendo em conta o valor da obra e aquilo que poderá representar no futuro.
DD: Resumindo e para finalizar, pode fazer um balanço geral.
MC: Temos as instalações operacionais, mais ou menos preparadas e dignas para continuar a participação no Popular de Barcelos, apareça alguém para prosseguir, temos os arquivos do Clube em ordem, o Clube não tem dívidas. Temos um livro da História do Clube na calha, só falta vontade de um mecenas…
DD: O que falta então?
MC: Faltam 18 sócios com as quotas em dia, com vontade de trabalhar pro bono e com intenções de fazerem uma lista e assumir os desígnios do GDRC.
DD: E se isso não acontecer?
MC: Se isso não acontecer continua como “dantes, o quartel em Abrantes.” Por nós a participação no Popular de Barcelos foi interrompida. Uma coisa garanto em nome desta CA. O Clube não fecha. Pode reduzir a sua actividade, mas, não fecha. É um ponto de Honra. O Aniversário da sua fundação, com Missa e Romagem ao Cemitério, para a deposição de uma coroa de flores pelos sócios falecidos, jamais irá faltar, nem que eu pague do meu bolso…
DD: Desculpe interromper, e as instalações?
MC: As instalações, só tem que ser mantidas fechadas e em segurança, para evitar actos de vandalismo ou roubos ou então rentabilizá-las, alugando-as a um clube que precise de instalações. Isto também está preconizado e previsto no RI, não é uma ideia mirabolante.
DD: Mas essa decisão só pode ser decidida em Assembleia Geral, certo?
MC: Certo, se os Sócios comparecerem e responderem afirmativamente à Convocatória o que me parece muito pouco provável. Repare, o GDRC realizou um jantar do “Dia da Mulher” no passado 7 de Março, dia Internacional da mulher. Um evento fantástico que permitiu gerar alguma receita para equilibrar as finanças do clube. Precisamos de 3 ou 4 homens para servir às mesas, não se conseguiu ninguém…todos os abordados “chutaram para canto”, acha que alguém se está para chatear? Não, ninguém! Ah e porque vem a propósito, a maioria das convivas eram de fora de Campo e nem sócias ou esposas de sócios eram, também por aqui se pode avaliar o divórcio entre as pessoas de Campo e o Clube. É geral, ninguém se está para chatear!
DD: O panorama não é deslumbrante…
MC: De todo. Não há apoios. Ao persentirem isso, ninguém se candidata, daí acreditar que não será fácil reverter a situação. Será justo fazer aqui uma ressalva: o apoio do Pároco e da Junta de Freguesia. Nunca o clube teve um apoio por parte da Pároco tão relevante e uma postura tão colaborante. O homem até já se ofereceu para fazer parte dos Órgãos Sociais, numa hipotética lista candidata…só que faltam os outros! E não posso esquecer o contributo anual da Junta de Freguesia que, ajuda a equilibrar as finanças e a minimizar o tal deficit acumulado ao longo da Época Desportiva.
DD: Há algum apelo que queira fazer?
MC: Não! Um clube é dos Sócios. Os Sócios têm direitos, mas, também tem deveres que estão escarrapachados no RI. Se não houver sócios activos e colaborantes, também não faz sentido existir o um clube….Já fomos ao ponto de abordar individualmente pessoas de Campo e não só, sócios com perfil para director e o resultado foi zero. Negativo, ninguém pode, ninguém está disponível. Albarda-se o burro conforme a vontade do dono. Não é o que diz o ditado popular? A voz do povo é a voz de Deus…
DD: Estão zangados? Amargurados?
MC: Não, de todo. Aliás, se estivéssemos zangados estávamos a faltar ao respeito e a ser ingratos com aqueles que colaboraram e continuam a colaborar, muito poucos, pouquíssimos até, mas são alguns…
E porque penso estra a entrevista a finalizar, queremos agradecer ao Jornal Domingo às Dez a oportunidade dada para este esclarecimento e para alertar a “rapaziada” para aquilo que esperamos, que não seja o canto do cisne. Obrigado em meu nome pessoal e em nome desta CA, que de momento representa o Grupo Desportivo e Recreativo de Campo.
Quero ainda felicitar-vos pelo vosso trabalho de excelência de informação desportiva de âmbito local, como é o Campeonato da AFPBarcelos e o vosso cuidado na apresentação e editorial.
DD: A entrevista com Mário Costa, que é um dos seis elementos da CA responsável pelos desígnios do GDRC e que esperam no entretanto serem substituídos, para o merecido descanso. Uma crise de quase vazio directivo que se adivinha e se perspectiva noutros clubes, a moda parece estar a querer começar. Oxalá não venham daqui males maiores.